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XXV ENCONTRO NACIONAL DA EPFCL-BRASIL
A FORMAÇÃO DO ANALISTA: URGÊNCIA DA NOSSA ÉPOCA
16, 17, 18 E 19 DE OUTUBRO DE 2025 – MACEIÓ/AL

Prelúdio IV
A Formação do Analista – Urgência da Nossa Época
Cinara Santos (FCL-Rio) | Elisa Cunha (FCL-Rio) | Flávia Tereza (FCL-Brasília) | Lulu Barbosa (FCL-Fortaleza) | Tatiana Siqueira Ribeiro (FCL-MS) | Vinicius Lopes (FCL- SP)
Núcleo de Estudos Psicanalíticos de Relações Étnico-Raciais, diversidade e equidade

A formação do psicanalista nunca foi um processo apartado das urgências de seu tempo. A própria psicanálise nasceu como resposta ao mal-estar na civilização e aos impasses subjetivos que dele decorrem. Em “A Questão da Análise Leiga” (1926), Freud já situava a formação do analista diante dos dilemas de sua época. Hoje, quase um século depois, nos perguntamos: quais seriam as interpelações dirigidas à psicanálise em 2025? Ou, mais precisamente, qual é a pergunta crucial que nossa comunidade analítica endereça ao Núcleo de Estudos Psicanalíticos Étnico-Raciais, diversidade e equidade?

Longe de oferecer respostas prontas, este texto é um convite à reflexão coletiva. Propõe articular as demandas urgentes de nosso tempo com os fundamentos da formação psicanalítica — um tripé sustentado por análise pessoal, supervisão e estudo rigoroso. Mas há um desafio adicional: como manter esse rigor sem ignorar as tecnologias discursivas de poder que marginalizam corpos e subjetividades? A Escola de Psicanálise, embora seja um refúgio contra o mal-estar, não pode se furtar a produzir saber sobre ele. O que acontece na polis ecoa no divã, e é nossa responsabilidade ética escutar seus efeitos.

É perceptível que os membros da EPFCL-Brasil reconhecem a relevância dos movimentos sociais contemporâneos — sejam eles pautados por gênero, sexualidade, raça ou etnia. No entanto, esse reconhecimento não anula as dúvidas que surgem quando tentamos articular as chamadas “políticas identitárias” com a prática psicanalítica. Como conciliar a singularidade do sujeito do inconsciente com as identidades coletivas?

Luiz Izcovich, em “A Escolha das Identificações” (Caderno Stylus 04), nos oferece uma pista crucial: as identificações, ainda que provenham do Outro, são sempre escolhidas pelo sujeito — mesmo que inconscientemente. Ele nos provoca com perguntas que ressoam diretamente em nosso debate: Se a análise desvela as identificações, que tipo de laço social resta quando elas já não servem como mediação? É possível conceber um sujeito desprovido de identificações? O que acontece com essas identificações quando a análise avança rumo ao seu término?
Essas questões revelam um axioma fundamental: o sujeito é indissociável do grupo ao qual pertence. Quando falamos em “dissociação”, referimo-nos justamente à fratura entre o sujeito e seu contexto social — pois o próprio sujeito é um efeito desse grupo.

Freud já nos mostrava que a neurose é uma resposta subjetiva às renúncias pulsionais exigidas pela cultura. Ou seja, o sofrimento individual nunca é apenas individual; ele é atravessado pelas contradições sociais. Lacan, por sua vez, nos lembra que o analista deve “alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua época” (1998, p. 321). Mas ir além disso é imperativo: é preciso situar tanto a formação do analista quanto os processos inconscientes no campo da geopolítica e da história.

Reconhecer as desigualdades entre o norte e o sul global, entender o narcisismo das pequenas diferenças que alimenta o mal-estar na convivência com o semelhante — tudo isso impõe uma responsabilidade múltipla: ética, política, histórica e, acima de tudo, clínica. A psicanálise não pode virar as costas às violências que produzem corpos abjetos. Seu compromisso é, simultaneamente, com a escuta do singular e com a crítica às estruturas que perpetuam a exclusão. Esse encontro não é apenas um espaço de debate, mas um chamado à ação reflexiva. Como formar analistas capazes de operar nesse cenário complexo? Como sustentar o rigor da psicanálise sem recair em dogmatismos que ignoram as urgências do mundo? São perguntas que exigem de nós não apenas respostas, mas um trabalho contínuo — pois a formação do analista, hoje mais do que nunca, é uma tarefa inacabada e coletiva.

Referências:
FREUD, S. (1926). A questão da análise leiga. In Obras completas de Sigmund Freud (Vol. 20, pp. 177-256). Rio de Janeiro: Imago. (Originalmente publicado em 1926).
___________ (1930). O Mal-estar na Civilização. Tradução de Paulo César de Souza, 1ª edição, p. 1-100. São Paulo: Companhia das Letras, 2010.
IZCOVICH, Luiz. A escolha das identificações. Caderno de Stylus, Rio de Janeiro, n. 4, 2016
LACAN, J. (1998). Escritos. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro: Jorge Zahar.

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