XXV ENCONTRO NACIONAL DA EPFCL-BRASIL
A FORMAÇÃO DO ANALISTA: URGÊNCIA DA NOSSA ÉPOCA
16, 17, 18 E 19 DE OUTUBRO DE 2025 – MACEIÓ/AL
Prelúdio VI
O desejo ético e a formação do analista
Bárbara Guatimosim
FCL Belo Horizonte
“Cabe formular uma ética que integre as conquistas freudianas sobre o desejo: para colocar em seu vértice a questão do desejo do analista.”
Lacan, J. A direção do tratamento (1958). In Escritos, p.621.
“Uma ética se anuncia, convertida ao silêncio, não pelo caminho do pavor, mas do desejo: e a questão é saber como a via de conversa da experiência analítica conduz a ela.”
Lacan, J. Observações sobre o relatório de D. Lagache (1960). In Escritos, p. 691.
A função analítica não é algo natural. Antes de surgir um analista temos um sujeito da neurose ou, um sujeito analisante, que sofre a falta, mas não quer saber da castração e consequentemente de seu desejo que dela deriva. Ele produz sintomas. Convidado a falar proliferam além dos sintomas, sonhos, lapsos na via das formações do inconsciente através das quais o analista opera, depurando o real da “diferença absoluta” que orienta o tratamento, desde o início, mesmo estando, essa diferença, encoberta pelo estranhamento da queixa sintomática.
Diferença encoberta e maltratada por uma lei insensata, paradoxal, uma lei que não convence, enunciada muitas vezes, por uma convenção, obrigação, norma moral, lei religiosa: a lei do supereu.
“Por uma ética”.
Com esse título Lacan finaliza sua crítica a Lagache e sua resposta ao supereu. A esse imperativo, Lacan responderá com a lei do desejo. O seminário da Ética da psicanálise é proferido juntamente na elaboração de Kant com Sade. “O que a análise articula é que, no fundo, é mais cômodo sujeitar-se ao interdito do que incorrer a castração” , nos diz Lacan, deixando claro que a lei ética do desejo indo além da interdição e do imperativo de gozo é uma conquista do sujeito, desde o real da castração. Conquista que alcança ainda essa singularidade, a diferença que cada um carrega como uma estranheza própria, na maioria das vezes como gozo sintomático, mas que pode vir a ser satisfação, gozo no sinthoma.
Então a via da singularidade a que visa o analista, ao se desatar do sofrimento sintomático orienta, circunscreve o desejo, promove a subjetivação da castração, que, mais do que nunca, na clínica atual, sob os efeitos do discurso capitalista, pede a obviedade da fórmula: “não se pode querer o impossível”!
A função analítica, não atende a demanda da solução de completude, mas cerne a causa do desejo e oferta ao sujeito isso que é o fruto do cercamento de RSI . O acesso à causa do desejo analisante prepara o desejo do analista mesmo que este não advenha, porque o desejo analisante, alçando o que o causa, já é ético, já estamos aí na ética da psicanálise. “Esse é um campo (do objeto a causa do desejo) em que o sujeito, com sua pessoa, tem que pagar, sobretudo pelo resgate de seu desejo. E é nisso que a psicanálise ordena uma revisão da ética.” . O analista atua, portanto, recuando sua pessoalidade, sem crer estar na suposta neutralidade, pois lembremos, o desejo do analista não é um desejo puro… porque visa, correlato da unicidade da diferença absoluta, este “objeto insensato” , o objeto a.
O desejo do analista se e quando advém, opera para além da causa do desejo do sujeito. O desejo de um sujeito torna-se desejo de analista, quando é desejo de desejo, quando essa causa se esvazia dos “quereres” da pessoa do analista e se empresta à causa do desejo para um outro sujeito que entra em análise. Quando a causa do desejo torna-se desejo de causa.
Diante disso, não podemos desconsiderar a importância tautológica da frase: “a psicanálise é o que se espera de um psicanalista.” Até porque entre o obtido e o esperado… Pois não em vão Lacan diz também que é preciso sempre poder escolher entre a psicanálise e os psicanalistas, já que uma e outros nem sempre coincidem. A formação do analista, ou sua de-formação, é o exercício de sua ética, a práxis da teoria, a experiência clínica do próprio caso e de outros, o exercício e transmissão da psicanálise em ato – Quando há do analista. A função analítica não é algo natural, nem garantida.
[1] LACAN, J. Observações sobre o relatório de D. Lagache (1960). In Escritos, p. 690.
[2] LACAN, J. O seminário, Livro 7, A ética da psicanálise, p.367.
[3] LACAN, J. A terceira. In: documentos para uma Escola IV – a terceira: uma Escola para a psicanálise, p.183.
[4] LACAN, J. Observações sobre o relatório de D. Lagache. Escritos, p.689.
[5] LACAN, J. A terceira. Op.Cit., p. 183.